O desenvolvimento tecnológico da virada do século até agora tem dado saltos importantes, em especial, no que se refere a tecnologia da informação. Hoje a capacidade de produzir e consumir informação foi exponenciado, embora, muito mais do lado da produção. O avanço da internet não se restringe ao processo de produzir e consumir informação, mas também a compra e venda de bens e serviços, esse conjunto de desenvolvimento tecnológico tem impactado positiva e negativamente na sociedade.

Em termos de sociabilidade política, fomos educados ao longo de gerações sob a perspectiva aristotélica que homem é um animal político, ou seja, só nos completamos como seres humanos em sociedade. Isso significa que o  processo hominização se dar pelo contato com o outro, e esse outro, é diferente. Claro que aqui temos a ressalva que a sociedade grega da época não tinha o grau de pluralismo incorporado da cidadania. Mas, ainda sim estamos falando em algum grau que a cidadania só se constitui em sociedade e seus diferentes componentes.

Esse tipo de sociabilidade do contato com o outro, faz com que aprendamos, em maior ou menor medida, educar os nossos anseios e desejos. Ou seja, mediar nossa atuação como cidadão a partir de nossas expectativas mas também com as expectativas sociais, o que necessariamente não são coincidentes. Assim, o não conflito com o outro é mediado pela própria presença do outro no contexto de interação face-a-face. Isso numa suposição que não vivemos num estado de natureza hobbesiano. 

Com isso não quero afirmar que tão somente viver em sociedade é o suficiente para eliminar o conflito, mas tão somente que o conflito tanto em termos de natureza quanto potencial ofensivo, é em grande medida mediado pela sociabilidade política, em especial, sociabilidade democrática, onde devemos tolerar o outro, ou seja, os custos de tolerar o outro é menor que o custo de eliminar o outro. 

Com o desenvolvimento tecnológico descrito acima estamos aos poucos perdendo essa sociabilidade política e a noção sobre tolerância ao outro. Os algoritmos de indicação utilizados inicialmente para sugerir produtos em e-comece foram traduzido para as redes sociais digitais. Assim, esses algoritmos das redes sociais digitais nos sugerem conteúdo e pessoas próximos das nossos anseios de mundo. Com isso parte do conflito é gerido por esses algoritmos, ou melhor, é eliminado, umas vez que nesses ambientes há maior propensão para viver em bolhas.

É bem verdade que na vida analógica há também nossas bolhas, mas ainda, temos que aprender a administrar o conflitos em cada esfera da vida, como escola, igreja e no lazer. Nas redes sociais digitais, diminui exponencialmente a quantidade de conflito que temos que administrar. Tanto no sentido do algoritmo restringir o outro, como na fluidez dos laços construídos fora e dentro das bolhas. Pois, o individuo está nesses espaços em grau tão elevado de atomização que pode ter duas estratégias ir para o conflito em respeito ao outro, ou simples bloquear (cancelar) o outro, ou seja, um baixo custo para eliminar o outro.

Esse elemento pode está nos levando em termos de sociedade ao cultivo de sociedades mais violentas e intolerantes com o outro. Pois, estamos em grande medida perdendo a capacidade de gerenciar o conflito, pois, agora podemos cancelar todo mundo. Mas, isso torna um problema para uma sociedade que ainda é altamente dependente do mundo analógico, afinal, ainda saímos de casa para estudar, trabalhar, e consequentemente nos deparamos com o outro. Assim, aquele individuo aristotélico tem um papel pedagógico fundamental para aprendermos a gerenciar os conflitos, afinal a sociedade é conflituosa em essência, mas a sua manutenção dependente da nossa capacidade de lhe dar com esses conflitos do cotidiano.